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Para ficar na história, a ciência comprova ondas gravitacionais previstas por Albert Einstein há 100 anos

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Previstas por Einstein há mais de cem anos, ondas gravitacionais abrem um novo campo de pesquisa para a exploração do universo

Pouco mais de cem anos após a proposição da Teoria da Relatividade Geral, o fenômeno das ondas gravitacionais, previsto por Albert Einstein, finalmente foi comprovado pela ciência. Há meses os boatos dessa descoberta vinham deixando a comunidade científica em polvorosa, mas, nesta quinta-feira (11/2), veio o anúncio oficial, divulgado pela National Science Foundation, em Washington (EUA).

A conquista, publicada em artigo na mesma data, foi obtida por cientistas do Instituto de Tecnologia da Califórnia (Caltech) e do Instituto de Tecnologia do Massachusetts (MIT). O consórcio está por trás do Observatório de Ondas Gravitacionais por Interferômetro Laser (LIGO, na sigla em inglês). Estimado em US$ 620 milhões (cerca de R$ 2,5 bilhões), o projeto conta com a participação de especialistas de diversos centros de pesquisa pelo mundo e envolve mais de mil cientistas – no Brasil, físicos do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e do Instituto de Física Teórica da Universidade Estadual Paulista integram a iniciativa. "Nós detectamos ondas gravitacionais. Nós conseguimos", comemorou David Reitze, diretor do projeto.

Perseguida há décadas, a comprovação da existência das ondas gravitacionais pode ser considerada uma das grandes descobertas científicas de nossa época. Além de mostrar que Einstein tinha razão, o anúncio fornece pistas importantes para nossa compreensão sobre alguns dos maiores mistérios do cosmos, como buracos negros, que não emitem radiação eletromagnética - são, portanto, muito difíceis de se estudar diretamente a partir da observação de micro-ondas, radiação infravermelha, luz visível, raios gama etc. “Até o momento, observamos a luz vinda do universo para entender o cosmos”, explica Rodrigo Nemmen, do Instituto de Astronomia, Geofísica e Ciências Atmosféricas da Universidade de São Paulo. “Analisar as ondas gravitacionais abre uma nova janela de conhecimento. É uma revolução na astronomia”, festeja o astrofísico, especialista em estudos com buracos negros.

Segundo a Teoria da Relatividade Geral, as ondas gravitacionais são “vibrações no tecido do universo”, ondulações à velocidade da luz no espaço-tempo, provocadas por interações entre corpos com massa. A forma mais famosa de representar o fenômeno é lembrar das ondulações provocadas por uma pedra ao ser atirada em uma lagoa de águas calmas – no caso do universo, as vibrações ocorreriam devido a acelerações nos movimentos dos corpos celestes.

Partitura do espaço-tempo

O problema até aqui era a dificuldade de perceber o efeito das ondas, uma vez que a gravidade é a mais fraca das forças fundamentais, cerca de 1040 vezes mais fraca do que a força elétrica, por exemplo. Segundo estimativas, as ondas gravitacionais chegariam à Terra dez mil vezes menores que um próton. Por isso, só fenômenos muito poderosos e velozes, como explosões de estrelas ou fusões de buracos negros, poderiam ser captados. “As ondas estão associadas a quaisquer eventos com deslocamento de massa. A Terra girando em torno do Sol, por exemplo, produz essa energia, mas ela é imperceptível”, explica o físico Adilson de Oliveira, professor da Universidade Federal de São Carlos e autor da coluna Física sem Mistério. “Nosso nível de detecção só consegue perceber as ondas gravitacionais em grandes eventos”, diz.

É aí que entra o fator sorte: pouco tempo após uma reforma no LIGO, sistema composto por dois interferômetros construídos nos Estados Unidos especificamente para captar ondas gravitacionais, os pesquisadores acreditam ter encontrado distorções no espaço-tempo causadas pela fusão de dois buracos negros gigantescos. “Eles não apenas detectaram as ondas, mas sabem quais são os objetos envolvidos no fenômeno”, destaca Oliveira.

As ondas detectadas pelos cientistas viajaram mais de um bilhão de anos no vácuo do espaço. Uma vez percebidas, foram analisadas por centenas de cientistas que identificaram padrões de oscilação próprios da fusão entre buracos negros. “É uma espécie de engenharia reversa. Por meio das ondas, os cientistas conseguiram identificar a massa dos dois objetos e do terceiro, formado a partir da fusão entre eles”, detalha Nemmen, que faz uma analogia com a música para explicar o processo: “As ondas gravitacionais são uma espécie de partitura do espaço-tempo, permitem a compreensão sobre os instrumentos envolvidos na sinfonia”, compara.

Nobel a caminho?

Para Oliveira, a possibilidade de analisar as ondas gravitacionais traz inúmeras alternativas de pesquisa, como ocorreu com a descoberta dos raios-x ou do radiotelescópio. “Assim como o Bóson [de Higgs] tinha que existir para que a física que conhecemos fosse verdadeira, as ondas precisavam estar lá, ou a teoria de Einstein estaria errada. Agora, poderemos pesquisar um outro universo de fenômenos astronômicos”, explica.

Especula-se que será possível, por exemplo, começar a desvendar as propriedades do graviton, sobre o qual só existem previsões teóricas até o momento. Assim como o fóton é a partícula da força eletromagnética, essa partícula sem massa estaria por trás das ondas gravitacionais. “Outra possibilidade que me deixa empolgado é a de entender o comportamento da gravidade quando a curvatura do espaço é muito violenta, como nas proximidades de um buraco negro. Até hoje, não tínhamos informações sobre isso, mas as ondas vão nos trazer uma ‘assinatura’ do fenômeno”, aposta Nemmen.

A importância do feito é tamanha que os dois especialistas ouvidos pela CH Online acreditam que os responsáveis pelo projeto LIGO ganharão o prêmio Nobel de Física nos próximos anos. “A partir de agora, vamos testar detalhadamente as previsões de Einstein sobre buracos negros. Finalmente vamos fechar a enciclopédia da gravidade, isso é o mais incrível”, vibra Nemmen.

Fonte: Simone Evangelista Especial para a CH Online

(imagem: MPI/Gravitational Physics/ITP Frankfurt/ZI Berlin)

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